quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Paroles, Paroles, Paroles…, Palavras, Palavras…, Words, ou de como o cronista começou a pensar que talvez pelo silêncio leve a água ao seu moinho, que não sendo de vento, nem do seu hálito precisa para continuar a rodar as velas.


O que é certo é que uma pessoa depois de pedir desculpa por um erro fica melhor e mais leve mas fiquei cá a magicar nas palavras lidas no L’OBS mesmo que não me aqueçam nem me arrefeçam porque em Portugal as palavras são outras agora querem que a gente vote na palavra do ano e eu que ando aqui a xurdir para ver se sobrevivo no meio do basqueiro deste sítio (Almada dixit) que se tornou um pântano nestes últimos tempos sem sequer poder ser acusado de cibervadiagem por já não estar no activo com a minha pensão por velhice o mais que posso é fazer cibervadiar os outros a quem transmito as palavras que encandeio umas nas outras sem reflectir só porque me parece que casam bem confesso que o que me daria gozo era uma selfie com a minha colega Sara Sampaio e daí dei um salto a Londres ao “Victoria Secret” mas ela coitada estava debaixo de umas luzes em soutien e calcinhas e disse-me para eu me pôr em roupa interior mas quando me viu as ceroulas da tropa que levei com receio do frio nas margens do Tamisa disse-me que assim não queria e até foi indelicada porque me disse vai mas é fazer uma selfie com o Paulo Portas e eu até sorri só de pensar que ele também não quereria porque os marinheiros dos submarinos não usam ceroulas há bué da tempo e habituado a periscópios sempre operacionais não ia perder tempo com o velhote que só tem é palheta mas já que falei do VPM sempre vos digo que o gajo é muito esperto e para jogar em todos os tabuleiros até convenceu o Primo Basílio a ir dar-lhe um abraço que pode ser a gazua para abrir as portas do PS não vão as coisas azedar na rua de S. Caetano e lembrando-me que o Paulinho gosta de FDS no Golfo fui dar ao jihadismo ou jiadismo como gosta o Bagão e andando a ler um livrinho intitulado “Histórias de Dinheiro na Bíblia” saltaram-me os episódios da traição de Judas por 30 dinheiros (Mateus, 26) e aquele do Esaú que esfomeado vendeu os direitos de progenitura ao seu irmão Jacob por um prato de lentilhas (Génesis, 25) isto por causa do Real Madrid ter tirado a cruzinha do seu emblema a ser usado onde o VPM passa os FDS porque recebeu uma quantia choruda por um acordo de patrocínio por três anos do Banco Nacional de Abu Dhabi e até me disseram mas não posso confirmar que o Vieira dos Pneus que devia 600 milhões de euros ao BES dívida que foi transformada na noite do desastre em fundos do BES Vida e do ESAF pelo lacaio Pires do Salgado (aquele de quem alguém disse que sempre que olha para ele o vê atrás do balcão de uma taberna a vender copos de três com um lápis roído atrás da orelha) pode ver-se livre desse encargo para sempre já que dos lados da Península Arábica lhe prometeram essa ninharia (que não tem comparação com os 200 mil que o Machete deu às vítimas do Estado Islâmico) se ele trocasse o “et pluribus unum” do emblema do glorioso por um “Allahu Akbar” não ficando a dever nada mas mesmo nada ao Banco Novo que mandou à televisão a cunha do novo candidato a DDT Horta Osório dizer aos ex-amigos do Ricardo agora amigos do Eduardo todo o stock de demagogia que tinha engatilhado atrapalhando-se a si próprio sem percebermos qual a camisola que queria que vestissem tendo provocado a ira dos produtores nacionais dos melhores vinhos do mundo quando anunciou que agora os clientes vão ter de fazer jejum de Barca Velha e beberem “Brilho da Uva” “Terra de Selmes” ou “Uvas Saloias” vinhos em cartão do Lidl que sempre a Ângela pode apreciar o gesto e a Teresa o João e a Inês passarem melhor os novos engodos a 92 dias e palavra puxa palavra descarto já a gamificação pois que ninguém me verá a dar aos polegares numa consola não passando eu em matéria de jogos do chinquilho do dominó ou do burro em pé mas como não me comem com as histórias da africana ébola e da ribatejana legionela que com os seus 6 mil + 11 mortos que não são mais que serradura tipo gripe das aves para os nossos olhos não verem os milhões de mortos de fome malária e genocídios vários e os milhares de tuberculose hepatite cirrose AVC’s  e acidentes de trabalho ficando-me nas mãos a queimá-las a palavra corrupção que afinal também posso mandar às urtigas já que soubemos que estatísticas internacionais por isso sérias disseram que em Portugal essa praga tem diminuído de há dez anos a esta parte estando seguramente resolvida com 4 ou 5 prisões preventivas com serventia de meios de comunicação social que todos sabemos que não vai dar em nada (depois peço desculpa se me enganar) o que é certo é que ninguém neste mundo me vai obrigar a votar em fofinho que é a palavra mais abominável da língua portuguesa já que alavancar narrativa resiliência empreendedorismo e as suas irmãs são em politiquês mas como no circo depois dos palhaços costuma entrar em cena um número de alta escola em vez de escolher uma palavra escolhi uma frase que foi dita pelo Professor Sampaio da Nóvoa “Penso nos outros, logo existo” que contraria o pensamento que hoje impera em Belém "Penso na minha Família, logo penso que existo" estás a topar oh MEO!

Abraço.

Lisboa, 11 de Dezembro de 2014
Octávio Santos

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Acto de Contrição, a Teoria da Conspiração e o Direito à Imprecisão.

Tendo-me sentado no Bar do Parque a ler o “L’OBS” da semana passada, não resisto a traduzir a caixa do Editorial do Director, Mathieu Croissandeau, intitulado “Paroles, Paroles, Paroles…”: “Os franceses têm a desagradável impressão, não só que o poder lhes mente, mas também que negue o que estão a viver diariamente, o que é muito mais grave”. Como não sou francês estou-me nas tintas, mas com esta na cabeça subo a álea central do Parque Eduardo VII, ao longe a gigantesca bandeira - que eu amo e respeito, mesmo pequenina,  com outras cores, de pernas para o ar ou com pagodes chineses em vez de castelos -, a fazer de pano de fundo à fálica escultura de João Cutileiro, que aproveitou o pedestal destinado ao Santo Condestável, não percebendo eu se o pétreo membro erecto, qual “doigt d’honneur”, como diz o meu Neto André, é dirigido ao passado ou ao futuro que é já presente.

Depois desço a Cardeal Cerejeira, viro à esquerda na António Augusto de Aguiar e passo diante da sede do BIC, monumento à nossa desgraça, para a qual nos atiraram um animal feroz, hoje na jaula, e um animal de nome, ainda tecnoformalmente fora da coelheira, ambos a precisarem de ir ao veterinário, o primeiro àquele que cuida da periquita da Maria de Belém e o segundo ao do coelho anão do Marques Mendes, que eu quero-os com saúde para que, chegado o momento, ninguém tenha pena deles, por muito que a Sociedade Protectora dos Animais se esgatanhe. 

Mas, como eu dizia, passando diante do BIC lembrei-me de um texto que escrevi há cerca de um ano, o qual se revelou completamente desprovido de verdade, tendo eu sido empurrado pelo gosto que tenho em cultivar a Teoria da Conspiração.  E como fui superficial, tendo-me deixado levar pelas aparências, venho fazer o meu Acto de Contrição, sem me gabar da acção como o Ministro Crato, mas pedindo desculpa a todos aqueles, poucos,  que acreditam em mim, embora sem prometer que não voltarei a cair no mesmo pecado, pelo Direito à Imprecisão de que me arrogo (ver meu texto de 6/2/2014), pensando que é preferível errar de vez em quando por excesso,  que estar calado por medo de quem manda, a assistirmos agora ao que aconteceu ao Banco de Portugal com as calças na mão diante da toda poderosa banda de malfeitores da telenovela “Os Amigos do Salgado”, felizmente em vias de ser desmascarada e desmantelada (ver as novidades sobre a Líbia e Miami). Segue o texto incriminado, com o meu reiterado pedido de desculpas, visto que tanto a Zara como a Massimo Dutti continuam lá desmentindo a anunciada expulsão, agradecendo ao mesmo tempo o favor de me indicarem outras faltas à verdade que possa ter cometido no referido texto, fruto da minha notória mitomania, dando-me assim uma oportunidade para mais um, ou mais, pedidos de desculpa.

“…sempre naquela onda de gabarolice que arvoro, declarando ver coisas que aos outros passa despercebido, vou-vos expor mais uma teoria minha acerca de um facto observado diariamente. 

Quando,  há mais de um ano, aquele edifício sumptuoso de granito rosa em frente ao El Corte Inglès, trocou o logotipo BPN para BIC, fiquei espantado ao ver crescer andaimes por ele acima, e, levando isso à conta de um excesso de zelo dos novos proprietários, os quais, com o benemérito patriota Eng. Amaral à frente, na mira de mais uma reforma milionária, tendo recebido 500 milhões de euros e desembolsado apenas 40 para comprar o edifício e o que ele comporta e representa, quisessem gastar uns cobres a lavar a cara ao seu novo “brinquedo” que, sendo de granito, estava em Estado Novo. Fui passando, e não havia meio de ver operários a povoar aquela rede metálica ortorrômbica , e a fazerem finalmente aquilo que era desnecessário. E, cada vez que passava, olhava, pensava, e pensava tanto, que até maus pensamentos se me assomavam à caixa dos pirolitos. Pensava no O. Costa, arrogante e prepotente banqueiro, agora de coleira,  que mais não fez que explorar o filão do chico-espertismo que, na Costa das Negociatas, tem estatuto de virtude. Pensava no seu patrono, o Sôr A.C.Silva de Boliqueime, o sogro da MEO (sabem?), que mora ali para os lados dos pastéis de Belém e do Páteo da Forca, que o pôs no poleiro, e que, por via disso (não há almoços grátis!), abichou uns milréis para a sua Família, nas vésperas do tsunami, e foi o que lhe valeu senão tínhamos o homem a bater à porta da Senhora Jonet, dada a miserável reforma com que vai ficar. Pensava no D. Lima de Maricá, que enfiou uma lima de Vieira de Leiria no bandulho de uma Senhora confiante e desprecavida, que aceitou ir com ele aos figos, para lhe palmar os 5 milhõezitos que lhe faziam jeito para pôr casa condigna na capital do Império (deles), tal Afonso da Maia, de Santa Olávia para o Ramalhete. Pensava no Conselheiro M.D. Loureiro, agora deslocado de Casablanca (As time goes on) para Vila Verde, no Sal, com escala em Belém, de onde saiu a custo, depois de ter feito o tirocínio da aldrabice e da falta de vergonha na cara, com o chefe supremo. Pensava no homem mais rico de Portugal, o Rei das Rolhas, sócio da mulher mais rica da África, Raínha do dengue, da cólera e da mal-nutrição, os quais devemos venerar em nome da freenança, porque ambos salvadores da pátria portuguesa: um exporta e a outra investe.

E continuava a passar até que um dia, vi a parte de baixo dos ditos andaimes, coberta com chapas metálicas onduladas brancas, que deixavam à vista, lá no fundo, as portas e as montras dos seus inquilinos Zara e Maximo Dutti.  E, operários de mãos à obra, viste-los! Numa das minhas inúmeras passagens pelo local, e tudo isto durava já há um ano e tal, ao ver pela cagagéssima vez aquela velhinha de 96 anos que está, com um banquinho, a estender a mão à caridade pública no semáforo em frente do palácio entaipado do BIC, porque, como disse à tempos na nossa televisão, tem filhos com reformas de miséria e netos desempregados, e não pode permitir que eles passem fome, fez-se luz no meu embotado espírito, e disse para quem estava sentado no carro ao meu lado: - Elementar, meu caro Watson! Não é que me veio de pensar, eu que adoro complôts e professo a teoria da conspiração, que toda esta mise-en-scène sem justificação aparente, esta ideia peregrina de cobrir de alto abaixo o mausoléu das nossas poupanças, com serapilheira de nylon e lata no roda-pé, não passava de uma acção de guerrilha urbano-comercial entre duas grandes potências? Traduzido para os menos versados em acções de guerrilha – tenho um curso de sapador de minas e armadilhas na Universidade de Tancos e Sta. Margarida - , ou os mais incautos, atrevo-me a reduzir este abundante ano de observação, numa coisa muito simples. A Sonangol quer despejar os seus inquilinos das lojas para finalmente ter uma entrada prestigiosa à altura dos seus pergaminhos e capitais, ou aí poder afixar as suas geniais ideias de marketing, para captar mais clientes. E vá de tentar asfixiar o adversário renitente em tirar dali as suas montras galegas, aproveitando a âncora do El Corte. Acontece  que a Inditex é só uma das maiores e mais ricas empresas da Espanha e do  mundo e, resistindo à prepotência dos petro-dólares, prolongou até agora o braço de ferro. Pergunto-me até quando durará esta acção de guerrilha fria e invisível no meio da nossa cidade ?  A ver vamos.

Tivemos entretanto a infausta notícia do falecimento da proprietária da Inditex, numa idade em que é legítimo desejar viver ainda mais duas décadas. Como este mundo é estranho! De mulher mais rica da Galiza, quiçá da Espanha, passou a mulher mais rica do cemitério de Lugo ou Orense, desculpem-me a imprecisão. Não creio que esta insignificante acção para-militar, no contexto da guerra económica global a que estamos a assistir, e a sofrer na pele, dure o tempo suficiente para que os cemitérios de Luanda, de Lisboa, e outros de outras terras de Portugal de Norte a Sul, da Lousada a Boliqueime, venham a receber tão ilustres e ricos hóspedes, durante o seu desenrolar. Entretanto, porque eles ainda estão vivos e têm herdeiros à altura,  a velhinha do semáforo continua lá a arrastar-se no meio do trânsito, para que os seus não passem necessidades, até que um automobilista apressado, míope ou menos atento, ou uma macacoa própria da sua avançada idade a mandem repousar, pobre como em vida,  no cemitério da sua aldeia. Que eu não sei qual é.  Mas também o que importa?” 

Abraço.

Lisboa, 4 de Dezembro de 2014
Octávio Santos (um pouco envergonhado)

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Descoroçoado com o ritmo dos acontecimentos, o cronista poisa a pena, mas não a perdendo como o gavião para poder, após este interregno poético em que a cedeu em parte à Iara Margarida, usá-la como bússola guia ou espada fendente, sempre que as circunstâncias a isso o obriguem


 
No sábado passado, dia da apresentação da minha primeira experiência “literária” dirigida a crianças, que devo à Editora storyTellMe, alguém amigo me dizia estar “angustiado e preocupado, com a sensação de estar prestes a entrar numa profunda e longa noite, sombra a pairar, que me aterroriza”, acrescentando que “ se sentia apavorado como se estivesse num comboio  de alta velocidade rodeado de gente que não tem nada a ver comigo, numa espécie de mundo paralelo em que há um grande esquema montado que não se percebe onde começa nem onde acaba, nem mesmo o que é, e eu quero descer e não consigo”. Assustei-me com a crueza dos propósitos e debitei umas banalidades para acalmar o susto evidente; sabes, é o sentimento geral, a sombra paira mas é colectiva, para mim já não tenho esperança, mas para ti que tens idade para ser meu Filho, pode ser que as coisas melhorem, embora só para os mais pequeninos se possa pensar voltar a uma normalidade, que de qualquer maneira não será aquela que conhecemos, não imaginando sequer nós o preço a pagar por isso. E com esta me safei de um ainda mais lúcido que eu.

Mas vamos lá à Poesia, que merece maiúscula. Os factos relatados interessam sobretudo os meus ex-colegas da AICEP, que continua a ser a “minha casa” pois foi de lá que passei à peluda, apesar daqueles 11 meses em que passei pelas (por) Necessidades. Para todos os outros temos os poemas que, esses, são universais. Tudo começou com o colega Rui Boavista Marques, então Administrador, a dar-nos a conhecer o filme japonês “Chanoyu” no qual ele desempenhou o papel de um jovem português chamado Stefano. Todos gostámos, tendo-nos o Rui dado, como programa extra, uma lição sobre a cultura japonesa da cerimónia do chá, confessando eu agora, e espero que ele não se zangue, que já tinha visto o meu Avô fazer aquilo, com tijela, pincel e um pó verde, mas para fazer a barba. Ora se o Senhor Administrador podia usar o Auditório para fins não técnicos, porque não dar seguimento à “aventura”?

Assim, criámos uma troyka (lagarto, lagarto, lagarto…) - eu e duas das minhas queridas Cristinas, a Filha do Professor Políbio de Almeida e a Neta do Palangana - e conseguimos convencer as cúpulas a fazer no Auditório uma sessão intitulada “Cultura no Auditório”, tendo como tema a Poesia. Para tal idealizámos um programa ligeiro em que quatro colegas diriam duas poesias cada um, sendo uma da sua própria autoria e outra de um autor consagrado à sua escolha, e os quatro colegas seriam, por ordem alfabética, a Iara Martins, o Joaquim Pimpão, o Miguel Malheiro Garcia e o Octávio Santos, ou seja, eu. Acontece que o Joaquim - Pedro Assis Coimbra, de seu nome artístico -, às voltas com os goulash nas margens do Lago Balaton, não pôde estar presente tendo delegado na colega Cristina Góis Amorim a leitura do seu poema. Acontece também que, tendo eu escolhido dizer um poema de António Gedeão, e sendo  a sua Filha, a escritora Cristina Carvalho (e já vão três Cristinas!), casada com o nosso colega José Meira da Cunha (aquele da visão holística), passou-nos pela cabeça convidá-la para nos falar do seu Pai, e não é que ela aceitou!

Como nestas coisas acontecem sempre imprevistos, a Iara não pôde participar,  por válidos motivos familiares,  para dizer uma das suas poesias e um lindíssimo poema de Alexandre O’Neill, o que a entristeceu muito, e o programa ficou assim estabelecido:

Ciclo “Cultura no Auditório”

Sessão : “Abaixo o Mistério da Poesia”, 17 de Novembro, das 17H30 às 18H30

Auditório da Av. 5 de Outubro, Lisboa

 

Programa

• Abertura pelo nosso Administrador, Vital Morgado

 

• Octávio Santos recita:

Viagem, de Octávio Santos (Sófia, no Hotel Park Moskva, em 25 de Junho de 1975.)

 

• Cristina Góis Amorim recita:

            Boa Gente Como Sempre, de Pedro Assis Coimbra (Joaquim Pimpão)

            Até ao Fim, de Nuno Júdice (in Pedro, lembrando Inês, 2001)

 

• Miguel Malheiro Garcia recita:

            Homens à Beira-Mar, de Sophia de Mello Breyner

            Poema , de Miguel Malheiro Garcia

 

• Octávio Santos recita:

Enquanto ( de António Gedeão, do livro Máquina de Fogo, datado de 1961)

 

• Convidada especial para o período de debate: Escritora Cristina Carvalho, que nos falará da obra e da personalidade de seu pai – Rómulo de Carvalho (António Gedeão)

Lembro-me que correu tudo muito bem e que os colegas que encheram o Auditório deram por bem empregue o tempo que lhes “roubámos” ao descanso. Lembro-me também de ter dito uma quadra minha improvisada, glosando esta quintilha do poema do Pimpão dito pela Cristina:

 
“tu vais acreditar como aconteceu

quando a Primavera de tão ousada

na acidez do vinagre de Modena

se meteu cuidadosamente

a fundo no meio do teu corpo”

 
e foi esta:

 
“O Pimpão é um brincalhão

Brinca tão completamente

Que usa vinagre de Modena

No teu corpo… cuidadosamente.”
 

Sempre em honra da poesia popular, que é também uma altíssima forma de arte, e não porque seja minha intenção abandalhar a coisa, li hoje ( e está lá para quem quiser ler) junto à venda de jornais e revistas que está na esquina da Miguel Bombarda com a Marquês de Tomar, em papel colado numa caixa da EDP, o seguinte escrito, que, dado o sublinhar da última palavra, pode ser também um código secreto para interessados naquele princípio activo (estive para alertar o SEF mas fui desaconselhado):

 
“Versos transmontanos

Porca/o nojenta o

Cão não é um

Saco cheio de merda

Para despejares nos

Passeios e na erva.
 

Mas o que me trouxe aqui hoje, justificando este  já tão longo preâmbulo, foi o desejo de homenagear a colega Iara que tanta falta nos fez naquela tarde, como prova o e-mail que, em nome de todos, lhe transmiti  na véspera:

 “Cara Iara, 

Como vamos sentir a sua falta amanhã, por si e pelos seus poemas, que acrescentariam qualidade à sessão, fui encarregado por todos de lhe agradecer a colaboração, dizer-lhe que contamos consigo para a próxima e desejar um bom aniversário à sua Mãe.

Bjs”
 
Assim, com autorização da autora, seguem os quatro poemas que me enviou, com imagens e tudo, para que a troyka escolhesse um para ela dizer na tarde de 17/11/2009 (já foi há 5 anos, meu Deus!), junto ao já citado poema de Alexandre O’Neill, e eles aqui ficam com um grande beijinho para a Iara, que aqui se revela uma poetisa de rara sensibilidade, e ainda por cima é também Margarida.

 Abraço.

 Lisboa, 27-11-2014

Octávio Santos
 

Afectos

 









preciso de cuidar de mim,

com ternura,

como cuido dos que amo.

preciso de esperança,

parar de atormentar a minha paz

com propósitos tão tristes quanto funestos.

e aprender de vez

que um dia mau

é apenas e tão só isso,

um dia mau.

mesmo que seja um ano,

ou até muitos,

anos maus.

ainda assim é só isso,

e não a vida inteira.

preciso de cuidar de mim,

ler Sophia em voz alta,

e deixar me adormecer no sofá,

a ouvir feliz Caetano,

a cantar o verso

onde um carinho às vezes cai bem.

 
J’aime les ballons
 












ar. cansado.

respirar.

cansada de tentar inspirar.

os meus olhos não aguentam.

como que uma culpa.

uma doença no ar.

um vírus

febril

com sintomas de desgaste.

queria criatividade.

a minha inspiração está presa

numa letra.

anda para cá e para lá

sem saber se me ajuda

a pensar

ou a escrever.

que se soltem os balões

para eu criar.

 
Senhoras e Senhores

 












senhoras e senhores

ando silenciosa

a alma precisa de tempo para,

num outro tempo, talvez,

transcrever o que absorveu de belo.

senhoras e senhores

no país das maravilhas a menina caiu.

de medo e sem rédeas

desabou.

flutuando no caos,

perdida no todo.

na cabeça a vida corre

como um rio,


memórias do agora sem forma de amanhã.


a tristeza é sempre funda.

senhoras e senhores,

começou a corrida sem o sinal sonoro de partida.

não é tempo. haverá tempo?

o tempo dirá.


a tempo será?

 
Nós


 

 




nós,

pretensos amantes

dois pontos equidistantes,

duas notas dissonantes,

espaço entre o depois e o antes,

um desejo sem afecto

o “A” e o “Z” do alfabeto

distância entre o longe e o perto.

eu, deste sonho, fujo

sem mesmo beijar-lhe a boca.

desamparo a emoção pouca,

de tê-lo no abraço

frágil como este laço

que se desfaz ao meu contacto

escolho o real ao abstracto.
 

Quatro poemas de Iara Margarida Martins