quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Atabalhoada crónica de um maquinista inexperto que não sabe manter-se nos carris, amalgamando notícias boas e más, falsas e verdadeiras, artistas da bola e políticos de meia tijela, jornais e pasquins, bancos e mochos, países com tento e países com amnésia, pássaros que voam e pássaros do (das) Caldas, ais de 2015 e gritos de 1945 em cenário de filme de horror, tudo isto no oráculo de Delfos, no Templo de Apollo, Sibila a tentar adivinhar o resultado da guerra entre a Grande Muralha e o Grande Canyon, no Vale do Tejo, com o 33 do Alto do Pina confuso no horizonte, sonhando o Golfo de Nápoles e a magia dos seus sortilégios.


Sento-me com o objecto da minha escrita já todo arquitectado na cabecinha e no bloco notas mas, como um combóio que à entrada da estação recebe ordem para entrar na linha 1 em vez da 2, como estabelecido, qualquer coisa me obriga a fazer a agulha para uma linha cega onde não consigo estacionar a minha indignação sem o ruído de travões a fundo, para que se saiba. Acontece que à meia noite de 31 de agosto os nossos canais televisivos declararam em perfeita unanimidade que a notícia do dia era o fecho do mercado das transferências, fornecendo-nos todos os pormenores da compra/venda/empréstimo de atletas (ou de uma parte deles - 20, 35, 50%) de uma clube para outro, fazendo especial clamor o valor de dois pós-adolescentes  que valeram juntos 155 milhões de euros, perguntando-me eu quanto foi parar aos bolsos dos novos negreiros cujo expoente máximo é nosso compatriota, mais um “melhor do mundo” para nos fazer inchar o peito de orgulho, embora a nossa habilidade e aptidão para gerir o tráfico de pessoas humanas não fosse novidade para mim que conheço a Cidade Velha de Santiago, e a sua história, como as palmas das minhas mãos. Para segundo plano passaram os factos e as imagens das fronteiras da Grécia com a Macedónia e da Sérvia com a Hungria, da estação ferroviária de Budapeste, do matadouro do Mediterrâneo, de Lampedusa, Catania, Kos, Lesbos, Calais e tantos outros lugares que fingimos não existirem, e também aqueles de Palmira, onde um velho de 82 anos – Khaled al-Assad, seu guardião -, preferiu a morte a vender-se aos novos senhores, poupando-se a imagem de destruição daquilo que amava e pelo qual viveu, tudo aniquilado às mãos do DAESH ou ISIS (Islamic State of Irak and Syria) que, agora que domina territórios em 5 países, ou ex-países, incluindo a Líbia, o Yemen e a Nigéria, já poderia legitimamente denominar-se provisoriamente ISISLYN, até novas conquistas.  Confesso que agradeci à notícia das transferências dos novos gladiadores, o ter  relegado para terceiro plano a promoção do Paulinho das Feiras a Aldrabão de Feira pelo facto de ter emulado o seu compatriota Oliveira da Figueira que, risível  paradigma virtual das virtudes lusitanas, vendia chapéus de chuva no deserto aos beduínos e chapéus altos aos sheiks, não se sabendo ainda se o nosso caixeiro viajante conseguiu vender máquinas de limpar neve em Maputo. Consta que, sendo também exímio comprador quando a sua conveniência assim o determina, certo que a justiça rangeliana é cega para os compadres, deu ordem para fazer patrulhar as nossas costas pelos “nossos” submarinos, a fim de garantir o que a sua pupila predilecta determinou, ou seja, que a frota espanhola continue a pescar as nossas sardinhas nas nossas águas para que as mesmas não faltem nos nossos pratos, mas de periscópio alçado e atento aos caxineiros porque com a Europa não se brinca e Portugal não é a Grécia. Felizmente  para os gregos que, esses, ainda aprenderam qualquer coisa com os ingleses: My Country, Rigth or Wrong. Nós também, mas com a Alemanha: Arbeit (mal pago) macht frei (quem lucra). Cada um escolhe os seus mestres.

Ainda com a incisiva frase do VPM nos ouvidos – “Mais vale um pássaro na mão que dois voar” -, eu, que nunca lhe meti o pássaro nas mãos (nem em lado nenhum),  quanto mais o voto,  deixei definitivamente de o ouvir, a ele e a todos aqueles que esvaziam a palavra política do seu alto significado, servindo-se, porque outros valores nos foram lançados à cara como pedra da funda de David, e falo das fotos dos pequenos Aylan e Galip (sempre afirmei que os anjos existem) na praia turca. Não quero ser mais um a especular com a suprema desgraça e dor dos outros, primeiro porque felizmente não a sei avaliar, e segundo para não ser obrigado a recordar que há anos que assisto na RAI a cadáveres de crianças somalis, eritreias, sudanesas, nigerinas, nigerianas e outras nas praias do sul da Itália, não querendo fazer a mim mesmo a terrível e incómoda pergunta: - Será que acordámos agora porque os meninos curdos são da cor dos nossos Filhos e Netos ?  Os amores antigos vêm sempre à gala e eu, que fui accionista fundador do Correio da Manhã juntamente com o Prof. Ernâni Lopes, o Carlos Barbosa, o Nuno Rocha, o Vitor Direito e tantos outros, tapei as primeiras páginas de quase todos os jornais do mundo que publicaram as fotos de Nilüfer Demir em Bodrum, com a primeira página do jornal generalista mais vendido em Portugal que, no mesmo dia, publicou a foto de três milionários do futebol - L.F. Vieira, Jorge Mendes e Siqueira -  com a legenda “ Mendes incontactável. Telefone impedido trava Siqueira”. Com isto atribuí ao Correio da Manhã (porra para os primeiros amores!) a medalha de bronze; a de ouro vai para as autoridades da República Checa (país de Jan Mazarik, Jan Palach, Milan Kundera e Vaklav Havel) que marcaram com um número  no braço os refugiados que atravessaram as suas fronteiras, como os tanques russos em 1969, e a de prata ex aequo para a Austrália, o Canadá, a Hungria e o Reino Unido, a primeira porque se esqueceu que os seus primeiros habitantes brancos foram o que de pior havia nas prisões britânicas, o segundo porque teve a falta de pudor de oferecer um visto de entrada no seu território ao Pai (que teve a dignidade de o recusar) dos meninos mortos quando o negou a toda a Família em vida, a terceira porque ressuscitou o Muro que tão boas recordações lhe deve ter deixado em 1956, e o quarto porque persiste em teimar, na sua grandeza, ser continente entalado entre duas ilhas, a Irlanda e o resto da Europa.

Ah, a propósito gostava de vos lembrar que o “Documentário de Alfred Hitchcock”sobre os campos de concentração nazis vai ser, ou  já foi, projectado durante o 72º Festival de Cinema de Veneza”, a decorrer de 2 a 12 de Setembro. É sempre bom repetir certos conceitos para que não caiam em desuso por inércia ou falta de informação.
Abraço.

Lisboa, 9 de Setembro de 2015
Octávio 

PS (escrito em 4/9):  Afinal o aperitivo que vos neguei vai ser servido como sobremesa porque, para um que pensa que pode resolver puzzles complicados mesmo sem ter as peças todas,  a tentação é grande. Acontece que a Dra. Manuela Ferreira Leite disse à TVI (não é  só o Marques Mendes que dá bitaites) a propósito da anunciada iminente venda do Novo Banco à Fosun, que lhe causava muita admiração e estranheza que o Banco de Portugal e o governo permitissem que a empresa chinesa que fez o que fez com a Fidelidade, adquirisse agora aquele que foi a maior banco comercial português. E disse mais, que até a imprensa norte americana já se tinha ocupado do negócio, alertando para o que poderia vir a ser o primeiro banco comercial europeu comprado pela China, facto  não do agrado da Casa Branca. Alinhei  as peças do puzzle que a Senhora tinha posto em cima da mesa – com intenção, sem ela, simples recado? -, e não me admiraria se, obedientes como somos a ultimatos vindos de quem tem poder para os fazer, o Banco de Portugal nos continuasse a adormecer com a venda à Fosun, hoje até ao fim do dia o mais tardar até ao fim da semana ou do mês, e no recato dos gabinetes, isto é, nas nossas costas, estivesse a obedecer ao Tio Sam e a preparar a venda ao Apollo, anunciando-nos a sofrida decisão, em nome dos altos  interesses da Nação, nas vésperas das eleições (mais vale um pássaro na mão…). E o que é o Apollo Global Management?  Como não invento nada, tirei isto do seu site:

Apollo is a leading global alternative investment manager. We are contrarian, value-oriented investors in private equity, credit and real estate. We focus our investments in areas where we can capitalize upon our integrated platform. We have applied this investment philosophy over our 24-year history, deploying capital across the balance sheet of industry leading businesses, and seeking to create value for our investors throughout economic cycles.

Traduzam vocês porque em inglês só sou bom a ler nas entrelinhas, e o que não li assustou-me. E quem é o CEO do Apollo ? É um tal Leon Black, célebre misterioso comprador do quadro “O Grito”, de Eduard Munch, por 120 milhões de US dólares. Se as minhas desconfianças se concretizarem (se não for assim  peço desculpa, mas foi a Senhora que me apurou o faro), temo que o Sr. Black  pendure no seu futuro gabinete da Alexandre Herculano, ao lado do quadro de Munch, as fotografias dos funcionários que irá dispensar (pôr no olho da rua) para manter a estabilidade, rentabilidade e credibilidade da empresa em nome do princípio de “create value for our investors throughout economic cycles”, quando os seus persuasivos agentes especialistas de mercados (vendedores de fumo) os convencerem que é para seu bem que irão começar uma vida nova e, sobretudo, melhor, podendo dar largas ao seu espírito empreendedor, o que lhes abrirá um futuro risonho, constelado de Auroras Douradas que eles estão a ajudar a construir.  Como o BdP, o PM, o VPM, a Senhora Luis e o resto da quadrilha (mais vale um pássaro na mão que um Costa a dar tiros à toa como se estivesse na Quinta do Conde) continuam a vender-nos que a venda aos chineses está por horas, fico tranquilo porque mais uma vez devo estar enganado, mas é sempre bom repetir certos conceitos para que não caiam em desuso por inércia ou falta de informação.

PS 2 (escrito em 6/9): Não sei se repararam mas o Sócrates passou do 44 de Évora para o 33 do Alto do Pina, e faz hoje, 6/9, 58 anos. Curioso que sou, e interessando-me por numerologia, fui consultar a Smorfia, tratado popular napolitano sobre o significado dos sonhos e dos números, que continua hoje a ser indispensável para fazer a ligação entre ambos e jogar o resultado no Totoloto, e o que me apareceu foi isto: 44, A Prisão (transparente como a água), 33, Anos de Cristo (que mártir, nos salvou), 58, O Embrulho (conto do vigário), 6, A que tem os olhos no chão (a Nação Portuguesa, por vergonha), 9, A Geração (esta, a mais sacrificada). No comments. Já que tinha a lista dos números à minha frente, fui ver também o meu: 23, O Pateta! Saio a correr para jogar estes números. Esta semana não pode falhar!