quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Petróleo de ontem e hoje, água de hoje e amanhã, guerras de ambos com as armas de sempre, 7 irmãs/5 bonecreiras a puxar os fios a tribos e a credos, ninhos cheios de passarinhos que nos bebem a água, livros com segredos ou talvez não, e carros, sempre carros, que até andam com água na gasolina, mistura alquimista que não se sabe ainda se faz andar os homens.


Hoje, ao contrário da semana passada, sento-me sabendo já do objecto da minha escrita, o que, parecendo facilitar complica tudo. É que, quando não sei a coisa sai, uma daqui outra dali, e lá acabo por ligar as ideias que, mesmo se fugidias e confusas, se comportam como a maionese que, quando deslassa, basta mais um fio de azeite e óleo de cotovelo q.b. para ficar boa à mesma; pelo menos os convivas não se queixam. Mas hoje, ligando notícias e factos aos três livros que tenho na mesa de cabeceira, que são sempre o que li, o que estou a ler e aquele que se segue, me pareceu que tudo tem um fio condutor que não é, por enquanto, aquele da escassez da água, da qual o velho e original Mad Max nos deu uma ideia apocalíptica daquilo que poderá vir a ser, mas lá estou eu a desviar-me do pressuposto e o melhor é ver se eu próprio percebo o que vos queria dizer.

Voltando aos livros, aquele que li foi “O Fim dos Segredos”, da jornalista e professora Catarina Guerreiro, cujo subtítulo “Tudo o que nunca lhe contaram sobre o mundo da OPUS DEI e da MAÇONARIA em Portugal” nos indica que trata da doméstica conquista do poder neste Portugal dos pequeninos, recheada de episódios caricatos que envolvem obrigações precoces de castidade com instrumentozinhos de torturazinha à sombra da cruz, caveiras e caixões em encenação teatral levada à cena em templos de pacotilha com personagens de uma espúria commedia dell’arte dignas da nova versão do Pátio das Cantigas. Aquele que irei ler é “As Sereias de Bagdade”, de Yasmina Khadra, que é só o pseudónimo do escritor argelino Mohammed Moulessehoul (sabe-se lá o que nos quer dizer com esta mudança de sexo literário), que já nos tinha deixado “As Andorinhas de Cabul”, “O Atentado”, “Os Anjos Morrem das Nossas Feridas”, entre outros, leitura obrigatória nesta minha tentativa de perceber alguma coisa do que se passa naquela desgraçada parte do mundo, do qual todos falam e poucos entendem. Mas é do que estou a ler, “O Despertar dos Mágicos”, de Louis Pauwels e Jacques Bergier, introdução ao realismo fantástico como reza o subtítulo, publicado em 1960, o qual, não sendo um romance embora talvez fosse essa a intenção dos autores, não sendo ficção científica mesmo que por ela se roce em cada página, nem um repertorio de factos bizarros como “O Livros dos Danados”, de Charles Hoy Fort, apesar de o citar abundantemente, não é tão pouco uma contribuição científica, um testemunho, um documentário ou uma fábula. É como que um rio em cheia que transporta todos os detritos acumulados desde a nascente, com a não velada intenção de nos dizer que, para além de não estarmos sós no Universo, este mundo em que vivemos é para quem detém os segredos, que são muitos (ou quase tudo), dado que pretende afirmar que todas as invenções humanas do último século (segunda metade do XIXº e primeira do XXº) já tinham sido, ou inventadas ou caídas (trazidas) do céu há muito, só que mantidas em segredo porque os nossos antepassados, mais sábios, astutos e previdentes que nós, as esconderam ao adivinharem os males que elas causariam, como, por exemplo, aquela dos alquimistas terem descoberto a fissão do átomo e fechado o segredo a sete chaves, segredo só partilhado com os Rosacruzes (que esses são bué da fixes), tentando que Hiroshima e Nagasaki  não acontecessem. Sendo o livro uma confusão do caraças, uma salganhada sem pés nem cabeça, um novelo cheio de nós sem ponta nem fim, não me perguntem se vale a pena perder tempo a lê-lo, mas o que é facto é que só agora vou na página 229 e não sou capaz de o largar até à 630 que é a última.

Depois vêm as notícias, e aquela da BMW ir equipar um carro de série com um motor, há muito usado em pista, com um sistema de injecção de água nas câmaras de combustão, o que, para além das emissões nocivas faz reduzir o consumo de gasolina para metade, aumentando a potência de uns 10%. Invenção da água quente que já estava inventada? Lembro que na nossa vizinha Espanha há carros movidos a ar comprimido, que um maluquinho em Portugal, nos anos 40, pôs um Dona Elvira a andar a óleo de rosmaninho que apanhava na Serra de Monsanto e destilava num vão de escada, incómodo alquimista desaparecido na natureza, e que, quando vivi em França, conheci um criador de vacas que transformou o motor do seu R4 para trabalhar com gás de bosta dos seus bovinos, que ele recolhia numa espécie de sino sobre a estrumeira e metia à pressão em garrafas de gás vazias, em vez de irem para o ar esburacar o ozono. Tudo rubis, ou seja, pedras preciosas nunca utilizadas em larga escala. Só a americana Tesla pôs até agora no mercado um carro eléctrico com 400 kms de autonomia, ou seja, útil,  mas mesmo assim ao custo de cerca de 100 mil U.S.$ e com quilos de baterias de lítio a reciclar pelo Godinho de Ovar, que é o mesmo que as pôr no lixo, que se lixem os que vierem.

Os Estados Unidos ultrapassaram a Arábia Saudita e a Rússia e são hoje o maior produtor mundial de petróleo, com uma produção de 11 milhões de barris por dia. Já eram também, desde 2010, o maior produtor de gás natural, tudo isto com a ajuda do chamado “fracking”, extracção de gás e petróleo dos xistos betuminosos, técnica de fracturação de rochas e injecção de calor que não compreendi bem, mas que para mim, que sou básico, é uma espécie de estupro incestuoso da Terra Mãe que, ofendida, reage com terremotos superiores a três graus na escala de Richter, o que está a acontecer, cada vez com mais frequência, nos estados de Oklahoma, Texas, Kansas, Colorado, Novo México e Ohio. A China, a Rússia, o Brasil, a Alemanha e, pasmem, a Estónia, não querendo ficar atrás, já estão a operar diligentemente para a criação do seus sismos domésticos. Sendo o maior consumidor de petróleo do mundo, os Estados Unidos necessitam mesmo assim de importar 7,5 milhões de barris por dia, pelo que já anunciaram que vão aumentar a sua produção diária para 13,1 milhões de barris até 2019. Desconheço se no COP21 se debateu sequer este problema “menor” da saúde da Terra, e não me perguntem se é por tudo isto que o preço do barril está agora a 25 U.S.$ e se por trás da situação estão, como no tempo em que mandaram assassinar Enrico Mattei, um puro que queria mudar o mundo, as chamadas “sete irmãs”, agora reduzidas a cinco: Exxon/Mobil, Chevron/Texaco, Shell, British Petroleum e Elf/Total. Não acredito em bruxas “pero que las hay, las hay”.

Não tenho nunca a certeza do que digo, reclamando sempre o direito à imprecisão, mas parece-me que todas as guerras e guerrazinhas que, como fogos em floresta lusitana (quer dizer, sem solução) alastram por tudo quanto é sítio no planeta azul, são provocadas e alimentadas para defender os interesses de quem interesses tem. Quem é que deita abaixo ditadores e mesmo presidentes eleitos para os substituir por outros mais dúcteis e amigáveis? Uma guerra nova num país africano é noticiada para os parolos consumidores de notícias, ou seja, nós, como um novo caso de ódio tribal, quase nunca se falando das corporações ou governos estrangeiros que estão por detrás de cada uma das facções em luta. E quem diz África diz Ásia, América Latina ou ex-União Soviética (Tchetchenia por exemplo). No Médio Oriente e no Magrebe basta trocar tribo por religião, ou delas fazer um cocktail, para termos o que temos, situação que já ninguém sabe segurar. Quantas comunidades indígenas foram riscadas do mapa por força do resultado da exploração petrolífera? De Equador à Nigéria, da Indonésia ao Chade, o ouro negro foi, e continua a ser, uma maldição. Fizeram bem os alquimistas em manter secretas as suas descobertas? Uma coisa é certa e consoladora: não corremos o risco de, até ao fim das nossas vidas, e falo por mim que sou velho, chegar a uma bomba e não termos gasolina para enchermos o nosso depósito. O que é bom, mesmo muito bom, e para nós este problema está resolvido; que se lixem os que vierem.

O pior é a água. Não em termos de negócio, que esse é cada vez mais florescente e rentável. Sabem que a Nestlé e a Coca Cola andam por esse mundo fora, em África e no Brasil - que tem 25% da água potável da Terra-, a comprarem terrenos sobre lençóis de água, para a venderem engarrafada aos habitantes que vivem sobre esses mesmos terrenos e que, não tendo acesso à água debaixo dos seus pés, que agora tem proprietário legal, morreriam de sede se não a comprassem a quem agora lha vende? Alguém disse, a propósito  da água mineral ser o ouro do século XXI, que a Nestlé é uma associação de malfeitores que também produz e comercializa alimentos para bebés. O pior é a água, dizia, porque, segundo a ONU, um bilião e quatrocentos milhões de pessoas não têm água tratada em casa e, desses, 500 milhões, em 29 países, sofrem da sua escassez. É assustador saber que uma cidade de 12 milhões de habitantes como São Paulo, não tenha água para a maioria da população, podendo entrar em colapso hídrico em questão de dias, e isto é notícia de agora que, acrescentando que não são as elites a sofrer a situação, mas os desfavorecidos habitantes de favelas e periferias, aconselhados pelo governo a diminuir o tempo do duche e a fechar a torneira ao lavar os dentes, histórias da carochinha que já não colam, o que nos leva ao bom e velho Mad Max; quem tem poder tem água e quem tem água tem poder. Será que a guerra da água está a bater-nos à porta? A nós não, aos outros. Que se lixem!

Stephen Hawking, bem conhecido cientista de Cambridge, de 74 anos, ao evocar uma sociedade democrática, considerou que “toda a gente precisa de ter uma compreensão básica da ciência para tomar decisões informadas sobre o futuro”, acrescentando que “não vamos parar o progresso, ou revertê-lo, por isso temos de reconhecer os perigos e controlá-los. Sou um optimista, acredito que vamos conseguir”. Eu não, e que o cientista me desculpe o pessimismo!

Mas voltemos ao “Despertar dos Mágicos”, meu actual livro de cabeceira:

“Não é a primeira vez que na história da humanidade a consciência humana é obrigada a passar de um plano para outro, e a passagem é sempre dolorosa”.

Li agora isto num papel meu sem ter a certeza de ter sido eu a escrevê-lo:

“Andamos à deriva, qualquer coisa está errada, as alquimias políticas, mortos e feridos nos atentados rotineiros, de vez em quando a Terra é sacudida, só um milagre”.

Hoje ao almoço a Manuela perguntou-me: - Quantos mortos é que já teria havido hoje por aí nesta maldita 3ª guerra?

-Tem piada que é precisamente sobre isso que estou a escrever a crónica desta semana, respondi eu, voltando à caneta.

Abraço.

Lisboa, 21 de Janeiro de 2016
Octávio Santos


PS: Talvez esta semana em Davos os grandes da Terra falem destas coisas, se não tiverem nada mais importante. Nós, com Barroso e Moedas, podemos estar tranquilos.