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Sugeriram-me
que tratasse este Natal com ironia; sentei-me a escrever com esse propósito,
não fui capaz, e penso que já todos perceberam que onde quero chegar é ao
perdão, palavra de fácil pronúncia, igualmente fácil compreensão do conceito,
mas muito difícil de levar à prática como programa.
Ontem,
por ser Natal, e porque vi ultimamente na televisão dois filmes relacionados –
“Maria de Nazareth” e “A Bíblia” -, durante os quais assisti a uma multidão
enfurecida suspender, perdoando, a lapidação de Maria Madalena, e ao nosso
Diogo Morgado, circunstancial Cristo, a perdoar os seus algozes porque não
sabiam o que estavam a fazer, resolvi finalmente perdoar a todos, sempre com um
olho na reciprocidade.
Assim,
começo por pedir perdão ao dito Diogo Morgado, porque escrevi há tempos, por
inveja, que ele era muito credível no papel de Jesus Cristo, principalmente
depois de morto, e perdoo àqueles que, por motivos promocionais, fizeram descer
a imagem de um “Smurf” (proximamente nesta rede!) durante a cena do filme “A
Bíblia”, na qual os Apóstolos reunidos esperavam a descida do Espírito Santo.
Gato por lebre!
Perdoo
os autores dos relatórios dos swaps,
dos bombeiros mortos este Verão, e da queda do avião da LAM, porque sei que as
suas conclusões vão servir para perdoar políticos, banqueiros e seguradores
profissionais, e banqueiros e seguradores amadores que já foram políticos.
Seria um desperdício perdoar os que já não contam, vivos ou mortos que sejam.
Lamentando
que Cristo não tenha sido perdoado por ter expulso os vendilhões do templo e por
ter anunciado a destruição do mesmo, quero perdoar aqueles que programaram a
destruição do edifício das nossas certezas, não deixando pedra sobre pedra, e
que permitem aos negociantes da nossa desgraça, manter aberta a lucrativa banca
onde depositamos as nossas almas em troco dos tostões com que nos matam a fome.
Durante
o Angelus, na Praça de São Pedro,
Francisco chamou a atenção para a banda de tecido branco que rezava:
“I Poveri
non possono aspettare!” (Os Pobres não podem esperar).
Embora
seja Francisco o homem bom que quase todos reconhecem, não me pareceu
vislumbrar no seu gesto o mais pequeno perdão para Barrabás.
Ao
ler o nome Galilei Saúde, envergonhado no rodapé de um exame médico, lembrei-me
de perdoar, num gesto magnânimo, tanto os bons como os maus ladrões: os primos
zangados, “o aguenta! aguenta!”, os rebentos da Goldman Sachs, os filhos
putativos da troyka, que seriam os
bons, metendo-os no mesmo saco dos mentores do BPP e do BPN (SLN agora Galilei-
há sempre uma tábua de salvação), quais Donas Brancas apresentáveis e com
amigos nos lugares mais altos da Nação (ainda o é?), que seriam, digamos, os
maus. Sem qualquer rancor.
Perdoar
Bagão - que nos quer convencer que a nossa palavra "desenrascanço" faz muita falta aos anglo- saxónicos - e César das Neves – amigo dos
“pobrezinhos”enquanto tiverem salários de miséria -, que continuam a
debitar-nos os ecos das sacristias impermeáveis ao pensamento de Francisco.
Perdoar Soares, o laico, e Freitas, o católico que, afinando pelo mesmo
diapasão, dizem agora aquilo que os ignorantes e néscios sempre disseram; que o
templo vai cair e que o Rei vai nu! Perdoar insignes e mediáticos economistas,
de Lourenço, o Vingador, que continua a defender a justeza dos princípios
caducos da ciência económica, a Ferreira, o Reciclado, que desceu até ao Sénior
(jornal dos velhinhos a quem roubaram as reformas), para nos convencer da
bondade da austeridade que, segundo ele (agora) foi o remédio justo para sair
da crise, só não tendo resultado mais cedo porque o Tribunal Constitucional
cumpriu a sua obrigação. Mal, segundo ele.
Não
me compete, nem tenho de perdoar, mas aplaudo o perdão que o Senhor Ministro da
Administração Interna concedeu ao ex-Director da PSP, “culpado” do triste
episódio das escadas de S. Bento - uma espécie de “secos e molhados” em tempo
de lei seca -, tendo-o remetido para Paris com cerca de duas dúzias de salários
mínimos nacionais.
Perdoo
sinceramente a revista Exame por ter eleito uma empresa compradora de ouro como
a melhor PME do país, tanto mais que empresas do mesmo ramo estão a fechar,
talvez devido ao facto de já não termos mais nada de valor para vender. No meu
prédio, o boneco dourado sem cara em fundo verde (esperança), que nos convidava
a entrar para deixarmos os anéis, deu lugar a uma Bodycare muito atractiva, onde cuidar os dedos entre outras coisas,
como a depilação completa masculina. Entrarei um dia destes.
É
tal a minha ânsia de perdão que, tendo ouvido ultimamente duras críticas ao
Papa Francisco pelo seu perigoso populismo, quero desde já perdoar àqueles que,
invocando que Santa Marta era irmã de Maria Madalena, comecem para aí a
insinuar que o Papa sul-americano (o próximo será negro! ouvi eu) prefere
habitar numa casa, cuja patrona tem esqueletos no armário, que viver protegido
no seu apartamento de função na ala direita do Vaticano.
A
propósito de Francisco, gostaria que me perdoassem o meu desejo de, tal como
Jesus Cristo ordenou a Lázaro: - Levanta-te e anda!, este repetisse a mesma
frase a todos os espoliados e humilhados deste mundo, em nome da freenança. Mas temo que a cólera, mesmo
legítima, seja imperdoável.
Quero
firmemente perdoar à Europa o facto de existir quando isso convém à Alemanha, e
de se dissimular, camuflando-se, quando os interesses são outros. Por exemplo:
a natural porta de entrada do Velho Continente para todos os refugiados
africanos e médio-orientais é a Itália que, por força dessa predisposição geográfica
e por incapacidade organizativa, tem essa imensa massa de infelizes amontoados
em locais que não é um exagero denominar “lagers”.
Agora que umas dezenas desses desesperados e maltratados“hóspedes” coseu
literalmente a boca com agulha, linha e dedal, em sinal de protesto, estou mesmo
disposto a perdoar a Itália por incapacidade, e a Europa por cinismo e
hipocrisia.
Desejo ainda perdoar todos os fiéis de balança que, por estarem ao serviço de
entidades com peso, são tarados para afixarem resultados enganadores. Que
servem os seus interesses e, principalmente, os da sua Família.
E
também aqueles que não suportando desvios a regras precisas de vestuário na
corte do faz de conta, votam ao ostracismo todos os que não usam avental,
incluindo aqueles que não sabem cozinhar.
Por
último, perdoo todos aqueles que se apresentaram no funeral de Mandela, ou dele
escreveram rasgados elogios fúnebres, por oportunismo político, fingindo que se
adaptaram aos novos tempos.
Acabo
pedindo humildemente perdão pela minha incapacidade de Vos transmitir um texto
tranquilo de Natal, como todos desejariam, e mereciam, coisa que não perdoo a
mim mesmo. Bom 2014, malgré tout!
Lisboa, 26 de Dezembro de 2013.
Octávio
Santos