Ele há sonhos que te
complicam a vida, criando a confusão e o caos, e não me refiro ao sonho da
anunciada vitória no Brasil nem àquele de viver num país decente, que esses, ao
menos, nos deixam uma esperança para o futuro, mas de um sonho sobre pintura,
provocado talvez pela impunidade com que escrevi a “Última Tela de Picasso”- pg. 141 do meu “Moínho de Vento, 23” -, já que não houve uma única voz a denunciar o
falso da minha pintura literária, havendo mesmo quem a transpusesse com grande
arte para a tela, acrescentando
valor àquilo que, para além de valor não ter, deveria ser punido por
desrespeito da verdade. E ainda bem que falo de sonhos, até agora só meus, e de
textos e pinturas circunscritas a um restrito número de pessoas conhecedoras
dos factos, porque no âmbito do país a coisa fia mais fino e estes dislates não
são aceites, ou então não seríamos a Nação que somos, e de que nos orgulhamos,
com quase 900 anos de história que curiosamente se cumprem no ano do meu
centenário. Cá estarei para festejar!
Mas vamos a factos
que nos tranquilizem antes de entrar em divagações sonhadas que nos poderão
desviar para uma outra realidade, esta virtual e inquietante. Temos, hoje e agora,
grandes homens que o mundo nos inveja. A França ainda hoje vive do prestígio do
General De Gaulle, o qual, para além do apelido se confundir com a Pátria, a
punha acima de tudo em todos os seus gestos e acções, até no seu sempre
repetido “Vive la France” quando
testava um microfone. Depois, pobre França, com Sarkozy e Hollande, este com
nome de outro país, não lhes resta que recordar o General e a sua “grandeur” e votar naqueles que ele
combatia e desprezava. Nós, felizmente, temos o Presidente Cavaco Silva, a quem
dei o meu voto sendo por isso o "meo" presidente (a), que acaba de receber o diploma
de “Bom Aluno” das mãos do gauleiter germânico, após ter provado, sob
interrogatório, ter aprendido a lição. Reparem na diferença: para De Gaulle
existia a França e o sonho de uma Europa do Atlântico aos Urais, para Cavaco
Silva existe “a minha Família” (sempre que possível no Salto do Lobo) e o sonho
realizado do Atlântico à Arena MEO. Talvez por isto o Miguel Sousa Tavares lhe
chamou palhaço - com a legítima indignação do Chapitô -, sem qualquer
consequência, não por ser filho da figura ímpar que tardiamente mereceu o
Panteão, e mesmo assim empurrada por Eusébio, mas por ser compadre do Dr.
Ricardo Salgado. O mesmo não aconteceu ao desesperado anónimo que vociferou
parte da sua cólera legítima sobre o ilustre personagem, que esse sim, caiu sob
a alçada da lei, condenado a pagar uma coima igual ao valor da magra reforma
declarada em tempos pelo ofendido. Uns perdoam-se porque estão encostados aos
donos do país, outros castigam-se porque são fracos, restando a tríade de
amigos incómodos que, também eles patriotas impolutos, pugnaram pela grandeza
da Pátria, confundindo-a com as suas algibeiras, no Governo, na SLN, no BPN, na
Galilei, em Maricá, Marrocos ou Cabo Verde, batatas quentes que não se sabe
agora o que lhes fazer.
Tencionava passar já
para o outro assunto que interessa a Nação para além da política, isto é, o
futebol, mas devo deixar uma nota sobre o Dr. António Costa porque, passando
várias vezes por semana na Avenida Edgar Cardoso - aquela das pegas, entre a
Rua Castilho e o Parque Eduardo VII, e estou já a ouvir perguntar o que é que
vou lá fazer com a minha idade -, e tendo de circular a 20 à hora tal é o
estado miserável do piso, me pergunto se tal é devido a uma exigência de marketing da Associação Nacional das
Peripatéticas para fazer abrandar os clientes, ou se para aquele que deu
ultimamente razão a Unamuno, que disse que Portugal era um país de suicidas, é
tudo normal e é assim que vai querer o país quando for Primeiro-Ministro:
esburacado mas com um empreendedorismo agressivo.
Mas vamos lá ao desporto
rei só para vos dar parte do meu orgulho pela maneira como os rapazes se
bateram, pelos 5-1 à Irlanda durante a excursão aos States para ver se o clima era idêntico ao de Manaus, pelo justo spread que nos divide da Alemanha, pelos
2-1 ao Ghana que nos coloca no 18º lugar, só abaixo do Equador na segunda
metade da tabela, pela excelente actuação do corpo clínico coadjuvado por um
fisioterapeuta do Real Madrid, mas sobretudo pelas fortes convicções do
seleccionador Paulo Bento que, não abandonando o barco (pávidos cobardes de
outras selecções derrotadas demitiram-se ou puseram o lugar à disposição) e
prometendo a mesma leal e esforçada tripulação para o Europeu de 2016, dando-nos
a certeza que, se não foi desta será para a próxima, se Deus quiser e desde que o Diabo
não se oponha. Do que não estou a gostar é da maneira como os comentadores
desportivos (parecem aqueles comentadores políticos que opinam, dão bitaites e
mandam recados, entre as reuniões do Conselho de Estado de que curiosamente
alguns fazem parte, um havendo que até faz pequeninas revelações à sua medida),
estão agora a revelar coisas que já sabiam antes: que para além do Godinho da
sucata de Ovar há um outro que faz a chuva e o bom tempo na Federação, que o
agente de Paulo Bento tem influência nas suas escolhas (quem diria!), que quem
não tem a password fornecida pelo CR7
aos seus amigos não tem acesso à equipa de todos nós, que são as apostas on line que ordenam o que se faz e o que
não se faz no mundo límpido e transparente do futebol. Apetece-me limar os
caninos e emigrar para o Uruguay!
E agora finalmente o
sonho, pois já estava a esquecer o assunto principal que me moveu a escrever
desta vez, mas que era indispensável explicar o porquê de não sentir medo das
consequências do crime artístico cometido, lá isso era, porque quando o mal se
confunde com o bem a prepotência sente-se com direitos. E foi isso que se passou
no meu sonho. Eu conto, embora a normal confusão dos sonhos não permita um
relato linear e verosímil. Num museu, não sei qual, não sei onde, uma exposição
de obras de grandes mestres da pintura estava patente ao público. E eu estava
lá, e também Ela (a mesma da Última Tela de Picasso), não dando porém pela minha
presença como se eu fosse o Homem Invisível, no meio daquelas salas repletas de
maravilhosos quadros, cada um na sua moldura, a ”Madonna col Cardellino” e “La Fornarina”, de Raffaello, mulheres feias
e malditas da Paula Rego que parecem acabadas de violar por um dos seu cães raivosos,
também eles mulheres, “A Vénus ao Espelho” de Rubens, “Amore Sacro ed Amore Profano”, de Tizziano, homens
que reflectem na face e no corpo disformes o horror que lhes vai na alma, de Bacon, a “Donna con
l’Ermelino” de Da Vinci, e tantas mas tantas outras maravilhas que não me vou
pôr aqui a elencar até porque - os sonhos são estranhos -, não me lembro quais
fossem, as cores esbateram-se-me na memória e começo a ver obras que não
existem, ou se existem não estavam lá, ou eram apenas montagens feitas pela
minha imaginação. Assim, vi um Hitler no “Cristo” de Mantegna, um “Retrato de
Dorian Gray” em mosaico degenerativo com fim (in)Fausto à vista, a “Mulher Cão”, da Paula Rego a saltar
para dentro do “Nascimento de Vénus”, de Boticelli, bonecada de Keith Haring a
fazer ginástica numa geometria de Mondrian, rasgões de Fontana na Gioconda, uma
paisagem marítima de Turner invadida pelos Pássaros de Hitchcock, Musas
Inquietantes de De Chirico a povoarem um campo de trigo de Van Gogh e outras
coisas, tantas e esquisitas associações de visões impossíveis na vida real.
Mas quando a vi
virada para a parede do fundo da sala a admirar “La Fornarina”, de Raffaello, e
a alçar a perna sobre a moldura para entrar na obra, estando eu, do outro lado,
como que hipnotizado pelo homem sentado de Bacon, que espetou com pregos na tela
a figura - Homem ou Mulher? - que a si se adapta, e seguramente merece,
lembrei-me mais uma vez da “Última Tela de Picasso” e, como se não houvesse
ninguém no museu que impedisse a minha compulsiva,
mas não por isso menos execrável acção,
atirei-me à tela de Raffaello, já com Ela lá dentro, cortei-a com fúria à
medida da tela dentro da outra tela do fumador de Bacon, e, entrando nela, lá a espetei arruinando com o meu acto insano duas obras de
arte e, ao mesmo tempo, a existência dos que nelas habitam. Impunemente,
espero, mas não sei por quanto tempo. O futuro o dirá.
Lisboa, 3 de Julho
de 2014
Octávio Santos(a) O meu Presidente, com P maiúscula, foi, e continuará a ser, o Dr. Luís Fontoura. Boa Viagem, e vemo-nos um dia destes se Deus quiser.
Maravilhoso, caríssimo Otávio! FG
ResponderEliminarCara Florinda,
ResponderEliminarA Senhora é o máximo! Para além de aplaudir quando me atrevo a violar a sua arte, digna-me com um "Maravilhoso" pelo sacrilégio de adulterar o intocável. Será responsável se eu, daqui em diante, me permitir tudo.
Abraço amigo
Octávio