quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Qualquer coisa ou coisa nenhuma. Ma(n)chete só crática para crónica paulatina sobre a nossa cruz, nos canónicos 14 Passos da Cruz da nossa Via Sacra, durante as quais, e em cada um, o cronista reza para afastar o medo e incutir a esperança



Estava noutra, imaginem-me a escrever um conto de Natal, doce, manso, com bons sentimentos, moral e tudo, quando me lembraram que tinha de escrever qualquer coisa para o blogue e eu, de cabeça vazia, embora me apetecesse gritar certas verdades, o que felizmente já os UHF tinham feito por mim (por nós), com o seu manifesto “Vernáculo”.

Por sorte fica sempre qualquer coisa por dizer neste nosso amado país, onde me garantiram que o crioulo “equatoguineense” vai ser língua obrigatória para nos mantermos na CPLP, onde cada dia a salganhada é maior e se corre o risco de mandarmos para as salgadeiras de quem nem porcos come, meninas nossas, mas mazinhas, que merecem ser denunciadas pelos queixinhas do costume, e onde renasce o medo que eu pensava fosse mercadoria invendável há 40 anos, mas que está a ser recuperada do fundo dos armazéns onde esteve guardada em naftalina, e pensando no que escrevi na crónica de 23/11/2013, que inaugurou este blogue, citando Papas que nos deram dicas de conduta, a primeira, de João Paulo II, que, em 27 anos de pontificado se limitou a mudar o Mundo: “Não tenhais medo!”, e, a segunda, de Francisco,  que em 6 meses já nos mudou a nós: “Tenham a coragem da esperança”, proponho, com a intenção de exorcizar o medo e de incutir esperança, esta Via Sacra, em 14 Passos da Cruz, como é do Livro:

1º Passo:         Juízes condenam à castidade os maiores de 50 anos
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de perguntar que nomes merecem os juízes que, para agradarem a um hospital PPP (para público pagar), que assim não vai ter de indemnizar uma Senhora por um erro cirúrgico crasso (ia escrever crato), sentenciaram que o sexo depois dos 50 é mais uma coisa acima das nossas possibilidades, e o que tu querias sei eu, minha tarada de merda! E já agora, de não terem medo de dizer a quem deveria administrar a Justiça que, uma sentença, justa ou injusta, vinte anos depois, é um roubo declarado à dignidade e à vida de qualquer cidadão. Mas tenham a coragem da esperança lembrando Dona María del Rosario Cayetana Paloma Alfonsa Victoria Eugenia Fernanda Teresa Francisca de Paula Lourdes Antonia Josefa Fausta Rita Castor Dorotea Santa Esperanza Fitz-James Stuart y de Silva Falcó y Gurtubay,[] 18.ª e actual Duquesa de Alba de Tormes, a qual, com 88 anos, ainda aí está para as curvas, e Don Alfonso que o diga!

2º Passo:        O Primeiro Ministro carrega a Cruz
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de ser despedidos e perguntem ao Primeiro Ministro como é que ele consegue carregar sozinho a sua Cruz, com o contrapeso do Crato, do Machete e da Luis, só para nomear aqueles com mais peso de responsabilidade no descalabro do país a que todos assistimos, num momento em que até as portas se lhe fecham na cara. A coragem da esperança não vo-la posso dar, já que num futuro mais ou menos próximo, em vez da cruz, teremos todos de carregar o Costa às nossas costas. Venha o diabo e escolha!

3º Passo:      O cronista cai pela primeira vez
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de não arranjarem emprego no Estado para os seus Filhos e perguntem ao Ministro da Solidariedade, Trabalho e Segurança Social porque é que a mim, que trabalhei até ao dia em que completei 70 anos, data limite para trabalhar no Estado, naturalmente porque se começa a perder faculdades mentais - ver os casos do PR e do MNE -, me foi atribuída pelo Instituto de Segurança Social, IP, uma “Pensão por Velhice”, designação indigna, vexatória e imprópria de um país que se diz civilizado. A coragem da esperança resta aquela de emigrar para o Brasil, onde um velho não é um velho mas apenas uma pessoa. 

4º Passo:        Costa encontra a Mãe
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de nunca mais serem convidados para cobrir as Marchas de Lisboa ou, num possível futuro, eventos mais importantes, e perguntem ao presumível futuro Primeiro Ministro se o encontro com a sua Mãe na noite da vitória teve alguma influência na recente publicação da biografia da excelsa Senhora, e se, pelo facto de ser sua Mãe passará a ter o mesmo sucesso editorial da Mãe do CR7. A coragem da esperança já a perdemos, pois que, tendo sido processada após o 25 de Abril por “ofensa ao pudor e incitamento ao crime” pelo seu programa “Aborto não é crime”, já é tarde para se arrepender seja do que for.

5º Passo:      Jonas e Talisca ajudam Jesus
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de nunca mais porem os pés no Estádio da Luz, e perguntem ao Luis Filipe Vieira se foram Jonas e Talisca, cada um com o seu hat-trick, a ajudar Jesus a manter-se, se bem que só por um ponto, à cabeça do Campeonato. A coragem da esperança, mesmo na Champions League, sendo eu do glorioso, é inesgotável.

6º Passo:      O Banco de Portugal limpa (enquanto pode) a imagem do BES
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de vinganças e retaliações do DDT (Dono Disto Tudo) e suas 5 Famílias, nem do ex-factotum do Jardim Gonçalves, Carlos Costa, e lhes perguntem, ultrapassando a Comissão de Inquérito em S. Bento, que todos sabemos estar lá para encobrir e não para revelar, como é que tudo isto foi possível num Estado de Direito, membro da UE. A coragem da esperança é a de que nasça uma nova geração de portugueses destemidos e incorruptíveis para pôr fim a isto e a muito mais.

7º Passo:       O cronista cai pela segunda vez
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de serem banidos das reportagens dos Jogos Olímpicos de 2016, e perguntem a quem manda no Brasil, onde o cronista pensava que um velho era uma pessoa (ver 3º Passo), porque é que o direito (não sei se uma obrigação é um direito) de voto passa a facultativo aos 70 anos. Porque já não contas? Aqui a coragem da esperança desvanece-se já que até o Novo Mundo se revela antigo e retrógrado.

8º Passo:      As Mulheres encontram-se na Via Dolorosa do Meco
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de serem dados ao ostracismo por um eventual possível futuro Presidente da República, nem perseguidos pelas Polícias Marítima e Judiciária, e perguntem, a um porque razão as praxes (mesmo com 6 mortos) são assuntos internos da Universidades, e aos outros se foi por incompetência, desleixo ou encomenda vinda do alto, que não fizeram minimamente o seu dever. A coragem da esperança está naqueles caloiros que tenham a coragem dos jovens de Hong-Kong, e digam não à prepotência dos instalados.

9º Passo:        O cronista cai pela terceira vez
Rezo para que os jornalistas não tenham medo que os poderosos arranjem maneira de os obrigar a revelar a suas fontes, e comecem a perguntar aos caídos, desempregados nos Centros de Emprego, condenados nas prisões, doentes nos hospitais públicos, sedentos de justiça nos Tribunais, roubados à porta do BPN, BPP e BES (por enquanto), escravizados em Espanha, Holanda e Dinamarca, professores não colocados, ou colocados a 700 km de casa, funcionários públicos hostilizados por crime de eficiência por "pavões" incompetentes mas intocáveis, enfermeiros a 3 euros à hora e a muitos outros mais, o porquê de tudo isto. A coragem da esperança é morta à nascença pela inevitabilidade da obediência que um pequeno país que não conta, deve à Nova Ordem da freenança, tão cara a quem nos governa.

10º Passo:    O Rei vai nu; Cavaco é despojado das suas vestes
Rezo para que os jornalistas percam finalmente o temor reverencial por quem está no trono, e perguntem cara a cara ao Presidente da República se a venda com lucro das acções que detinha com a sua Família, nas vésperas da derrocada do BPN, foi fruto de uma informação do seu correligionário e amigo Oliveira e Costa, o que configura crime de inside job, agravado pelo facto de ser o Primeiro Magistrado da Nação, ou se foi algum passarinho que lho disse ao ouvido nos Jardins do Palácio de Belém. A coragem da esperança só se manteria de pé se a vergonha na cara ainda existisse neste malfadado país, onde em tempos existiam homens que, por delito de honra, se apresentavam, com a sua Família, de corda ao pescoço junto dos ofendidos, que neste caso somos todos nós. A imagem do Rei que vai nu só se apagaria com um hara-kiri no Reino do Pastel de Nata.

11º Passo:     Portugal é amarrado a um memorando
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de perder todas as retribuições que recebem de jornais, televisões, revistas e rádios onde têm assento, voz e imagem, muitas vezes como comentadores, sem pensar quem são os donos desses meios de comunicação social, e façam um inquérito sério e profundo, tipo Watergate, que explique as razões, os meandros, os intervenientes e os segredos das obrigações assumidas com organismos de duvidosa competência e comprovada dependência da finança internacional, leia-se Goldman Sachs, que nos amarraram a todos, e nos diga os nomes dos responsáveis – sem nos virem contar que a culpa foi nossa – pela fanática austeridade imposta e consentida que se abateu sobre um país e um povo. A coragem da esperança é, neste caso, idêntica à de alguém que perdeu um ente querido numa catástrofe e quer saber como se passaram realmente as coisas, e, sobretudo, recuperar o corpo.

12º Passo:     Portugal morre e faz o testamento a banqueiros, petroleiros e a políticos seus lacaios
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de cair na desgraça, ameaçados de morte, ou coisa pior, e perguntem o que é que se passou com o escândalo BPN, no qual interveio como criminoso primário a Liga dos Amigos de Boliqueime, como guardião do sistema o Governo português que nos subtraiu 650 milhões de euros para a benemérita e patriótica acção de salvamento, para pouco depois o “oferecer” por 40 milhões (30 dinheiros!) ao Eng.º Mira Amaral por conta dos seus intocáveis amigos angolanos, recebidos de braços abertos como investidores que vêm ajudar a salvar a economia do país. Com as calças do meu pai também eu sou um homem! A coragem da esperança cai por terra perante a subserviência dos nossos governantes para com os nossos “salvadores”.

13º Passo:     Portugal é descarregado como lixo pelas Agências de Rating
Rezo para que os jornalistas não tenham medo de serem considerados provincianos ignorantes das leis que regem a ultraliberal finança internacional, e dos agentes que mantêm em pé estas contas faz de conta, e perguntem qual o trabalho que fazem tais agências - Moody’s, Fitch e a outra que decide se “your standards are rich or poors” -, em que parâmetros se baseiam, quem lhos fornece, se são autónomas e independentes ou se recebem ordens, e de quem, como acontece com as consultoras, para que servem e quem servem, se pensam que, protegidas nos seus arranha-céus de vidro, somos todos AAAsnos, BBBestas ou CCCamelos e que não sabemos o jogo que jogam. A coragem da esperança, diante destes senhores, boia na água da sanita, que me perdoe o Papa Francisco, à espera de quem mande puxar o autoclismo.

14º Passo:    Portugal é sepultado
Rezo para que os jornalistas tenham medo, por si e pelas suas Famílias, por não terem feito o seu dever para evitar que o seu próprio país seja sepultado miseravelmente sob o peso de uma dívida com juros agiotas que engordam os fortes, que, únicos interessados no dinheiro que nos emprestam, só eles sobreviverão. A coragem da esperança é mais forte que nunca, porque quando não se pode descer mais, ou se fica no fundo, ou se começa a erguer com a fúria do desespero.

Ontem, o único político europeu que hoje faz um esforço para merecer ser comparado aos pais fundadores da Europa, o Primeiro Ministro italiano Matteo Renzi, 40 anos, ao bater mais uma vez o pé às exigências da Ângela, como ele lhe chama, disse: “ - O futuro é só o início!”.

Abraço.
Lisboa, 30 de Outubro de 2014
Octávio Santos

 

4 comentários:

  1. Sempre contundente e certeiro! O estilo é do melhor, razão porque continuo fiel leitora do sereno, agitado apesar de tudo e mobilizador de reflexão, sempre.

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    1. Cara Azinheira,
      Muito obrigado pelo constante estímulo. Temo que a serenidade esteja em fim de stock o que me retira poder de reflexão, e não a tendo não poderei transmiti-la aos outros. Falo a sério.
      Beijo
      Octávio

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  2. Espantoso de certeirice e a propos. Adorei a referência à muito icónica Duquesa de Alba, uma das minhas musas - embora o seu texto desperte, nas profundezas mais profundas de mim, ímpetos pasionarios e de Padeira de Aljubarrota e só me apeteça mesmo despachar para fora deste chão e à pazada uns quantos tipos que por aí circulam, coisa que a Senhora Duquesa certamente não aprovaria (e daí...)

    No mais, continuo a bater palmas. Obrigada por estas prosas saborosíssimas!
    Flor

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    1. Cara Florinda,
      Obrigado pelas palmas (de gáudio). Desta vez deu-me para esta Via Sacra onde misturei alhos com bugalhos, letra e música dos UHF com juízes desajuizados, Senhora de nome quilométrico com ministros de cérebro milimétrico, biografia de Mãe às costas do Filho com azes da bola brasileiros (terror dos zagueiros), velho que conta os tostões da pensão com banqueiro que conta os milhões da evasão, votos e praxes obrigatórios de ambos os lados do Atlântico, caídos (não os do Vale de D. Francisco por la gracia de Dios) sem hipótese de se levantarem com reis nus que já não levantam nada, um país a sair do lixo e a enterrar-se na dívida, todos à espera de um funeral e das palmas (do martírio). “O futuro é só o início”.
      Abraço
      Octávio

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